A POSSIBILIDADE DE TRANSFERÊNCIA DE EMPREGADOS DE EMPRESAS QUE COMPÕEM O MESMO GRUPO ECONÔMICO E O RESPECTIVO ENQUADRAMENTO SINDICAL – João Paulo Gregório

É comum as empresas que compõem o mesmo grupo econômico promover a transferência de empregados entre si, para fins estratégicos e como forma de evitar demissões.

A questão é como deverá ser realizado o enquadramento sindical quando o empregado é transferido para empresa que, mesmo pertencendo ao mesmo conglomerado, possui atividade econômica totalmente diversa.

Sabe-se que o fator determinante para o enquadramento sindical do empregado é, em regra, a atividade preponderante da empresa, sendo exceção, apenas, os casos de categoria profissional diferenciada, nos termos do § 3º, do art. 511, da CLT.

Nesse sentido, havendo atividade econômica preponderante, seja em uma determinada empresa ou num grupo econômico, é o enquadramento sindical desta atividade que irá determinar as entidades sindicais, patronal e profissional, que terão o direito à representação do empregador e do trabalhador.

De acordo com o entendimento doutrinário, Arnaldo Süssekind e Délio Maranhão afirmam que, em regra, o enquadramento do trabalhador decorre da atividade preponderante da empresa de que é empregado; mas há exceções, restritas aos profissionais liberais, trabalhadores autônomos e empregados integrantes de categorias profissionais diferenciadas.

No caso de transferência de um empregado para uma outra empresa do mesmo grupo econômico em que a atividade exercida ou é a mesma, ou é similar ou conexa da empresa anterior, não ocorrerá alteração no enquadramento sindical do empregado.

Ocorre que, há situações de empresas que fazem parte de um mesmo grupo econômico e que, apesar de estarem submetidas a uma mesma administração, possuem personalidade jurídica própria e desempenham atividades econômicas que não guardam qualquer relação com as demais empresas que compõem o grupo empresarial.

Neste caso, a impossibilidade da aplicação da norma coletiva a qual o empregado era submetido antes de sua transferência se dá em razão da necessidade de observância da paridade entre a entidade representante da categoria profissional e a entidade sindical representante da categoria econômica, não sendo plausível a aplicação ao contrato individual de trabalho de vantagens advindas de negociação firmada por entidade que não representa os envolvidos.

É esse o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST), conforme decisão a seguir transcrita:

DISSÍDIO COLETIVO – AJUIZAMENTO DA AÇÃO POR SINDICATO REPRESENTATIVO DE SEGMENTO PROFISSIONAL – IMPOSSIBILIDADE – CRITÉRIO DE ORGANIZAÇÃO SINDICAL POR CATEGORIA MANTIDO PELACONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 – IMPRESCINDIBILIDADE DE CORRESPONDÊNCIA COM A ATIVIDADE EXERCIDA PELO SETOR ECONÔMICO SUSCITADO: Não há falar em conflito coletivo autêntico e especificamente caracterizado, para cuja solução seja necessária a interferência do poder Judiciário, na atual ordem jurídica, sem que haja correspondência entre os segmentos profissional e econômico envolvidos, sob o prisma da atividade desenvolvida por cada qual. Processo que se extingue, sem julgamento do mérito. (TST-RO-DC-377.081/2002.4, SDC, Rel.Min. ARMANDO DE BRITO).

Inclusive, a matéria é objeto da Orientação Jurisprudencial (OJ) da Seção de Dissídios Coletivos (SDC) do TST OJ nº 22, que diz:

“Sindicato. Correspondência das atividades profissional e econômica envolvidas. Legitimidade ad causam do sindicato. Correspondência entre as atividades exercidas pelos setores profissional e econômico envolvidos no conflito. Necessidade.” (DJ, 25.05.1998).

Com relação a esse tema, seguem ainda as seguintes decisões do C. TST:

“EMBARGOS. BÔNUS-ALIMENTAÇÃO NATUREZA JURÍDICA. PARCELA ESTIPULADA MEDIANTE NORMA COLETIVA. EMPRESA INSCRITA NO PAT. 1. A instância ordinária registrou que a parcela “bônus-alimentação” era paga em decorrência de previsão em norma coletiva. 2. Desse modo, a verba não se incorpora definitivamente aos contratos de trabalho, a teor da Súmula nº 277 do TST.

Por conseguinte, a alteração da natureza jurídica da parcela, em face da adesão da Reclamada ao PAT, não implica modificação do contrato de trabalho ou violação a direito adquirido. 3. O acórdão embargado está de acordo com a Orientação Jurisprudencial nº 133 da SBDI-1 do TST. Embargos não conhecidos. (TST; E-RR 106.297/2003-900-04-00.0; Primeira Subseção de Dissídios Individuais; Relª Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi; DJU 14/12/2007; Pág. 822)

RECURSO DE REVISTA. GARANTIA DE EMPREGO ESTABELECIDA EM NORMA COLETIVA. REVOGAÇÃO POR CONTRATO COLETIVO POSTERIOR. SUBSTITUIÇÃO POR INDENIZAÇÃO ESPECIAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO DIREITO ADQUIRIDO. SÚMULA Nº 277 DO TST. APLICABILIDADE. As cláusulas coletivas somente produzem efeitos durante o seu prazo de vigência.
Havendo substituição ou supressão de direitos anteriormente assegurados por nova negociação coletiva, deve prevalecer a vontade das partes, expressa no contrato coletivo vigente. Em sendo a garantia de emprego substituída, nos recentes pactos coletivos, por indenização especial, prevalece a última, por ser a norma em vigor à época da dispensa do reclamante. A Súmula nº 277 do TST tem aplicação não só nas hipóteses em que a fonte formal do direito vindicado é de natureza heterônoma, mas também naquelas em que a garantia for instituída mediante instrumento normativo de produção autônoma (acordos e convenções coletivas de trabalho). Portanto, em consonância com a aludida Súmula a decisão regional, quando proclama que as cláusulas constantes de acordos coletivos, convenções coletivas e sentenças normativas não se integram em definitivo aos contratos individuais de trabalho. O STF perfilha entendimento que se coaduna com tal diretriz, ou seja. O de que as condições estabelecidas em convenções coletivas de trabalho ou sentenças normativas prevalecem durante o prazo de sua vigência. Recurso de revista não conhecido.” (TST; RR 666.365/2000.9; Primeira Turma; Rel. Min. Vieira de Mello Filho; DJU 25/04/2008; Pág. 91) (grifo nosso)

Com base nos entendimentos jurisprudenciais elencados acima, infere-se que as vantagens obtidas na negociação coletiva não são incorporadas ao contrato individual de trabalho, não cabendo, por conta disso, submeter tais vantagens ao empregado que já não se encontra inserido na abrangência daquela norma.

Nesses termos, o empregado transferido de uma empresa para outra, do mesmo grupo econômico, mas com enquadramento sindical distinto, se submete às normas coletivas aplicadas aos empregados da empresa para o qual foi transferido, sendo mantidas, apenas, as condições e os direitos trabalhistas de sua contratação, visto que estes já estavam incorporados em seu contrato de trabalho.

É esse o entendimento que vem sendo firmado no judiciário trabalhista. Vejamos:

“Alterada a atividade preponderante da empregadora, tem-se, por consequência, a alteração do enquadramento sindical de seus empregados, assegurando-se-lhes a preservação do núcleo básico do contrato, a saber, os salários, cuja irredutibilidade é assegurada constitucionalmente, o tempo de serviço, que é recepcionado pela nova empresa e os seus respectivos consectários. Desta forma, não faz jus o empregado a conquistas vinculadas ao sindicato da categoria a que estava anteriormente filiado.” (TRT/PE, 2ª Turma -01621-2005-009-06-00-8-Rel.Juiz Ivanildo da Cunha Andrade – D.O.E. 30/06/2006)

“TRANSFERÊNCIA DE EMPREGADO. EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. LICITUDE. Não se reveste de ilicitude a transferência de empregado, entre empresas do mesmo grupo, sem qualquer alteração de função, e mantido o salário, ainda que desmembrado, para quitar horas extras excedentes à sexta, decorrentes do novo enquadramento sindical. A ausência de prejuízo é confirmada por acordo coletivo posterior, que fixou, com a interveniência do sindicato, as mesmas condições para uma coletividade de empregados. Exclui-se a condenação em horas extras.” (TRT-PR-RO 16.159-1998 – Ac.3ª T 17.514-1999 – Rel.Juiza Wanda Santi Cardoso da Silva – 06.08.1999).

“TRANSFERÊNCIA DE EMPREGADO ENTRE EMPRESAS DO MESMO GRUPO ECONÔMICO. A mudança de empregador, em razão de transferência aceita de forma tácita pelo empregado para empresa do mesmo grupo econômico, não acarreta, necessariamente, a rescisão do primeiro contrato de trabalho. Trata-se de alteração compreendida no poder diretivo do empregador, cuja ilicitude, a teor do artigo 468, da CLT, dependeria da prova do prejuízo e da ausência de consentimento, ainda que tácito. Assim, mantidas as mesmas condições de trabalho e contados os direitos trabalhistas da data de início do primeiro contrato, não se divisa ilicitude na transferência, necessária à caracterização da rescisão contratual. Recurso conhecido e provido.” (TST-RR-391.129/1997.8 – Ac. 3ª Turma – Relatora Ministra MARIA CRISTINA IRIGOYEN PEDUZZI – DJ 28.l0.2004).

No entanto, o empregador precisa se atentar ao seguinte: após a transferência, empregados com contratos de trabalho diferentes, exercendo a mesma atividade.

Diante disso, há riscos de eventual passivo trabalhista decorrente de condenações fundadas em equiparação salarial, se constatados requisitos previstos no art. 461 da CLT, quais sejam, idêntica função; trabalho de igual valor, compreendido como aquele de igual produtividade e com a mesma perfeição técnica; e tempo de serviço para o mesmo empregador não superior a 4 anos e a diferença de tempo de função não for superior a 2 anos.

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“ENQUADRAMENTO SINDICAL – REGRA GERAL – O enquadramento sindical do empregado é determinado pela atividade preponderante da empresa empregadora, exceto em se tratando de categoria diferenciada, o que não corresponde à hipótese dos autos. Regra insculpida no art. 511, §§ 2º e 3º, da CLT. Recurso de Revista conhecido e a que se nega provimento.” (TST – RR 485933 – 5ª T. – Rel. Min. João Batista Brito Pereira – DJU 14.02.2003) JCLT.511 JCLT.511.3 JCLT.511.2.
“A atividade preponderante da empresa é que deve assegurar o correto enquadramento sindical, caso contrário criar-se-ia representações de tantas quantas forem as atividades necessárias ao funcionamento da empresa, que teria de enfrentar o cumprimento de diversos instrumentos coletivos simultaneamente.” (TST RO-DC 256.075/96.8 – Ac. SDC 202/97, julg. 03-03-97, Rel. Ministro Antonio Fábio Ribeiro) In Revista LTr, 62- 03, págs. 404/405, 1998).

SÜSSEKIND, Arnaldo. MARANHÃO, Délio Maranhão, Pareceres, São Paulo, 1973, p. 222.

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João Paulo Gregório

Advogado do escritório Petrarca Advogados

Petrarca Advogados