Recomendações para as melhores práticas de compliance nas doações realizadas por empresas – Carolina Petrarca e Nathália Siqueira

A importância de se estabelecer regras, procedimentos e uma política institucional para regulamentar as doações a serem realizadas pelas empresas.

Apesar de a economia brasileira ter sido fortemente impactada pela pandemia do novo coronavírus (covid-19), o setor privado vem se mobilizando de forma a mitigar seus efeitos negativos cumprindo a sua responsabilidade social.

A Associação Brasileira de Captadores de Recursos – ABCR lançou o Monitor das Doações, plataforma que contabiliza e identifica as milhares de doações realizadas para auxiliar o combate à covid-19. Até o presente momento, estas montam mais de R$ 5 bilhões (cinco bilhões de reais), sendo 83% (oitenta e três por cento) provenientes de empresas.

A mola propulsora desse movimento de doações decorre da vontade que tem se percebido de realizar ações solidárias durante a pandemia. As iniciativas são louváveis e devem fazer parte de forma mais intensa no que chamaremos de novo normal (mundo pós pandemia). Para isto recomenda-se que as doações sejam feitas com segurança e transparência.

Nesse cenário, apesar de a desburocratização e a agilidade serem primordiais para que as medidas auxiliares sejam mais rápidas e eficientes, as providências preventivas de compliance também o são. Dessa forma, as empresas não apenas evitam possíveis riscos e exposições negativas, bem como, garantem sua idoneidade (o que se faz extremamente pertinente, principalmente se considerados os acontecimentos sucedidos no país no período pré-pandêmico).

Quando as doações são destinadas aos entes da Administração Pública, o controle nos parece ser mais rígido, isto porque, a legislação prevê procedimentos específicos elucidados pelo decreto 9.764/19 (recentemente editado pelo decreto 10.314/20).

Contudo, no caso das doações concedidas às empresas, fundações ou órgãos privados, os procedimentos adotados não precisam necessariamente ser os mesmos daqueles previstos pelo mencionado decreto. Todavia, o que se recomenda, é que as práticas de compliance garantam maior efetividade no controle das doações feitas entre particulares.

Inicialmente, de maneira a assegurar a sua idoneidade, recomendamos ao doador não efetuar doações para empresas ou órgãos fiscalizadores de suas atividades. A devida seleção dos donatários é primordial para garantir a credibilidade da doação.

Ademais, ainda em um momento prévio, é interessante que, tanto o doador, quanto o donatário, possuam um programa de compliance consistente e/ou uma política de doações que estabeleçam todas as regras, condutas e procedimentos que os Administradores devem adotar ao realizar uma doação.

Tal providência garante a padronização preliminar do procedimento, antecipando eventuais adversidades e estipulando diretrizes claras para a operacionalização da doação. Por esse motivo, quando as partes são empresas, aconselha-se que os envolvidos sejam seus próprios funcionários, pois estes estão devidamente orientados e alinhados com as suas práticas.

Tão logo surja a intenção à doação, faz-se pertinente a efetuação do background check do donatário, devendo ser averiguado o seu histórico e reputação, bem como, de todos aqueles envolvidos no processo. A realização de um eficiente trabalho de auditoria sobre o donatário mitiga surpresas (negativas) futuras, evitando que o doador esteja relacionado com desvio de doações e corrupções.

Ademais, o donatário deve demonstrar, de forma clara, a finalidade da doação e a maneira que a aplicará em seus objetivos. Dessa forma, as partes devem elaborar um plano de monitoramento e de prestação de contas, para que, quando efetuada a doação, o doador consiga continuar fiscalizando a sua destinação. Importante, observar que algumas doações acabam sendo realizadas por um período maior. Nesse caso recomendamos que seja estabelecido um procedimento de acompanhamento dos recursos doados para evitar desvios e para assegurar que alcancem sempre o seu objetivo.

Para que a transparência de todo o procedimento seja garantida, a doação deve ser formalizada por um Contrato de Doação. Sugere-se que, dentre as suas disposições, seja elucidado que o feito se trata de mera liberalidade, não havendo qualquer interesse entre as partes em auferir possíveis vantagens desta. Devem-se incluir normas de conformidades prevendo a obrigatoriedade da observação do plano de monitoramento e da prestação de contas a ser avençados entre as partes.

Deve ser determinado precisamente o montante a ser doado, bem como, toda a descrição técnica do objeto (caso a doação não seja financeira). Nesse sentido, é importante a elaboração de cláusula específica estabelecendo a isenção da responsabilização por parte do doador pelo mau uso do objeto doado.

Adicionalmente, é fundamental a observação da Lei Anticorrupção (lei 12.846/13), sendo prudente a estipulação de cláusulas à luz, não apenas de mencionada lei, como também da legislação aplicável a cada caso.

Por fim, para a maior segurança das partes, é recomendável ser estipulada a possibilidade de reversão ou reconsideração da doação, caso alguma cláusula contratual seja infringida.

Elaborada a formalização da doação, é aconselhável que os responsáveis pelo compliance da doadora a aprove, haja vista a necessidade de esta estar alinhada com todas as diretrizes da empresa e que a doação seja devidamente contabilizada.

Após a concretização da doação, é essencial que as partes cumpram o quanto avençado, devendo o doador acompanhar continuamente o plano de monitoramento, e o donatário, executar fielmente o disposto em referido plano, bem como, disponibilizar as informações necessárias para demonstrar a devida destinação da doação.

Em atenção aos princípios da publicidade e transparência, é aconselhável que o doador promova o compartilhamento da prestação de contas de todas as doações que realizar, evitando, assim, qualquer obscuridade ou dubiedade de seus colaboradores ou, até mesmo, da comunidade em que atua, bem como, mantenha em seus arquivos todos os documentos que comprovem as doações.

Referidas práticas são determinantes para que seja garantida a transparência nas relações, a proteção da imagem dos envolvidos e a devida aplicabilidade das doações no combate ao covid-19, de forma a auxiliar o país e mitigar os consequentes efeitos negativos da pandemia.

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Associação Brasileira de Captadores de Recursos. ABCR lança o Monitor das Doações da COVID 19. Disponível clicando aqui. Acesso em: 08 de Junho de 2020.

Associação Brasileira de Captadores de Recursos. Monitor das Doações. Disponível clicando aqui. Acesso em: 08 de Junho de 2020.

BRASIL. Lei nº 12.846, de 1º de Agosto de 2013. Disponível clicando aqui. Acesso em: 18 de junho de 2020.

DOAÇÕES em tempos de Covid-19. Cescon Barrieu, 05 de Maio 2020. Disponível clicando aqui. Acesso em: 04 de Junho de 2020.

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*Carolina Louzada Petrarca é sócia do Petrarca Advogados.

*Nathalia de Assis Siqueira é administradora de empresas e colaboradora do Petrarca Advogados.

Petrarca Advogados