A mudança de estabelecimento de membro da CIPA a pedido do colaborador: há, necessariamente, perda de mandato e da estabilidade? – Dannúbia Santos Sousa Nascimento

A perda do mandato e a estabilidade provisória ao membro da CIPA, diante do pedido de transferência de estabelecimento feita pelo próprio colaborador.

Introdução

Outro dia, fomos consultados por uma de nossas clientes acerca da seguinte situação: o (a) membro(a) da CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes -, que tenha pedido transferência de estabelecimento, deixa de ser membro da referida Comissão e, necessariamente, perde a estabilidade ou não?

Nos deparamos com uma questão que parecer ser simples, mas que na realidade, não é tão fácil, especialmente, ante a ausência de clareza na legislação, principalmente na CLT e na NR-5 sobre essa matéria.

Além disso, o questionamento levou em consideração que embora tenha havido a transferência de estabelecimento, o local de trabalho anterior não foi extinto, bem como a ideia que de o membro da CIPA é eleito para exercer seu mandato na localidade em que foi escolhido.

Nesta hipótese, diante da transferência a pedido do(a) colaborador(a), sem extinção do estabelecimento anterior, como ficariam as questões atinentes à: (i) permanência como membro(a) da CIPA; (ii) a estabilidade em razão do cargo para o(a) qual foi eleito(a)?

Diante das possíveis controvérsias, passamos a tecer algumas reflexões e considerações sobre pedido de mudança de localidade pelo cipeiro e os reflexos dessa ação.

O que é a CIPA e quais as principais questões que envolvem o membro desta comissão?

Como descrito, a CIPA é a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, órgão interno da empresa, especializada em segurança e medicina do trabalho, que tem por objetivo a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho.

Mais objetivamente, é órgão formado por representantes da empresa e dos empregados, e tem como previsão legal principal os arts. 163 a 165 da Consolidação das leis do Trabalho.

O Ministério do Trabalho e Emprego, visando regulamentar a atividade da Comissão, editou a Norma Regulamentadora 5 – NR-5, que detalha, dentre outros aspectos, os objetivos, a constituição e as atribuições dos membros da CIPA.

Os eleitos como membros da CIPA cumprem mandato de 1 (um) ano, sendo permitida a reeleição. Um detalhe importante é que os membros da Comissão, eleitos para o cargo de direção, não podem sofrer dispensa arbitrária, tendo como fundamento motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro, o que lhe garante estabilidade pelo período contato desde o registro de sua candidatura, até 1(um) ano após o final de seu mandato1.

Outro ponto de salutar importância garantido aos membros da CIPA é a vedação de sua transferência para outro estabelecimento, sem a sua anuência, conforme item 5.9 da NR-5, ressalvado o disposto no art. 469 da CLT, ou seja, são exceções: a transferência de empregado exercente de cargo de confiança, ou na hipótese de previsão contratual de transferência, ou decorrente de real necessidade do serviço, e ainda, nos casos de extinção do estabelecimento em que labora o trabalhador.

Quando o colaborador, membro da CIPA, pede transferência e passa a trabalhar em outro estabelecimento, ele(a) perde a condição de cipeiro e a estabilidade?

O colaborador escolhido como membro da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes é eleito para, dentre outras atribuições, identificar riscos do processo de trabalho, elaborar plano de trabalho preventivo de acidentes, divulgar informações relativas à segurança e saúde no trabalho adstrito àquele estabelecimento no qual foi nomeado.

Essa limitação dos poderes como membro da CIPA é decorrente do próprio processo eleitoral, vale dizer, são os pares daquela determinada localidade quem exercem o poder de escolha para que o membro eleito ali exerça o seu mandato.

Se o colaborador membro da Comissão pede a sua condução para outro estabelecimento da mesma empresa, tem-se que os colaboradores daquela nova localidade não exerceram a escolha daquele colaborador transferido para ser o seu representante na CIPA.

É neste sentido que entendemos, salvo melhor interpretação, que o membro da CIPA que tenha solicitado mudança de endereço, dentro do curso de seu mandato, e que passe a exercer seu trabalho em outro estabelecimento, perde o seu cargo como membro da Comissão.

Quanto ao segundo ponto, relativo à estabilidade, se o colaborador muda de estabelecimento, ainda que tenha sido a seu pedido, diante do silêncio do legislador tanto na CLT, quanto na NR-5, entendemos que a estabilidade permanece pelo mesmo tempo previsto no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e na NR-5 – desde a candidatura, até 1 (um) ano após o final do mandato.

Salvo melhor juízo, o legislador deixa claro que a estabilidade não é uma vantagem pessoal do indivíduo eleito, mas uma garantia para aqueles membros da CIPA. No entanto, a perda da estabilidade é condicionada, pelas previsões legais, a duas hipóteses:

(i) Caso o estabelecimento em que o colaborador cipeiro tenha sido extinto;

(ii) E no caso de demissão por justa causa, quando comprovadamente tenha o colaborador cipeiro praticado um dos atos previstos no art. 482 da CLT.

Se o colaborador eleito muda de estabelecimento, sem que o estabelecimento anterior tenha sido extinto, e se não é o caso de rescisão contratual por justa causa, não havendo hipótese legal diversa, parece-nos o caso de manutenção da estabilidade, até o término do prazo legal e normativo.

Neste interim, a Súmula 339 do TST, dispõe que

A estabilidade provisória do cipeiro não constitui vantagem pessoal, mas garantia para as atividades dos membros da CIPA, que somente tem razão de ser quando em atividade a empresa. Extinto o estabelecimento, não se verifica a despedida arbitrária, sendo impossível a reintegração e indevida a indenização do período estabilitário. (ex-OJ 329 da SBDI-1 – DJ 09.12.2003)

A jurisprudência, em semelhante sentido, e.g., traz as seguintes previsões:

MEMBRO DA CIPA. ESTABILIDADE. EXTINÇÃO DO ESTABELECIMENTO. TRANSFERÊNCIA DO EMPREGADO PARA OUTRA UNIDADE DA EMPRESA. A estabilidade provisória do cipeiro não constitui vantagem pessoal, mas garantia para as atividades dos membros da CIPA, que somente tem razão de ser quando em atividade a empresa. Em razão de contingências técnicas, econômicas e financeiras, encerradas as atividades na unidade onde o autor trabalhava, não se verifica a despedida arbitrária, sendo impossível a reintegração e indevida a indenização do período estabilitário (inteligência do item II, da Súmula 339, do TST). (TRT-12 – RO: 00029100220155120006 SC 0002910-02.2015.5.12.0006, Relator: GISELE PEREIRA ALEXANDRINO, SECRETARIA DA 3A TURMA, Data de Publicação: 12/07/2016).

Vejamos: se não é o caso de dispensa do colaborador, e nem o caso de extinção do estabelecimento, ante a ausência de previsão legal e normativa, e considerando a ausência de decisões jurisprudenciais uníssonas em sentido contrário, bem como em observância ao princípio da proteção ao trabalhador, entendemos, analogicamente, ser cabível a manutenção da estabilidade até o término do mandato.

A estabilidade, a nosso sentir, é direito irrenunciável, e cujo entendimento encontra baliza em acórdão proferido pelo Tribunal Superior do Trabalho, nos autos do precedente RR – 6582-63.2011.5.12.0004, razão pela qual, mesmo a transferência a pedido do cipeiro, não ensejaria a perda de estabilidade.

Obviamente, o tema é tratado aqui utilizando-se uma hermenêutica extensiva, e não se esgota com tais reflexões. Ainda que haja a anuência do colaborador cipeiro, a irrenunciabilidade da estabilidade nos parece ser, até ulterior entendimento, a diretriz a ser considerada quando da alteração de estabelecimento do membro da CIPA, em detrimento do cargo então por ele(a) ocupado.

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1 Art. 10, inc. II, alínea “a”, da ADCT.

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Brasil. Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível aqui. Acesso em 10 dez. 2021.

Brasil. Norma Regulamentadora nº 5. Disponível aqui. Acesso em 10 dez. 2021.

Estabilidade a membro da CIPA é irrenunciável, decide turma do TST. Acesso em 10 dez. 2021.

Dannúbia Santos Sousa Nascimento
Advogada graduada pela Universidade Católica de Brasília – UCB. Especialista em Direito Processual Civil, pela Universidade de Santa Cruz do Sul/SC. Integrante da equipe do Petrarca Advogados.

Petrarca Advogados