Direito Marcário: Requisitos e reflexões sobre a elevação da proteção de uma marca a nível de alto renome – Amanda Resende Costa, Thaís Gladys Burnett e Luciano Lourenço Neto

A fim de elucidar sobre as possibilidades e requisitos para o registro de uma marca de alto renome, é necessário analisar a legislação vigente e a sua interpretação extensiva para compreender a mácula ao Princípio da Especialidade das Marcas.

1. Introdução: Do conceito e pressupostos da marca de alto renome

Inicialmente se faz necessário elencar o que é uma marca e o que diferencia uma marca comum daquelas classificadas como marca de “alto renome”. A Lei de Propriedade Industrial (LPI), em seu artigo 1221, define marca como o sinal distintivo visualmente perceptível que identifica, direta ou indiretamente, produtos e serviços.

Já em sentido estrito, temos o termo “marca” como “um nome ou desenho que identifica junto aos consumidores um produto ou serviço oferecido no mercado.”2

O âmbito mercadológico, o mais compreensível no ponto de vista de análise preliminar, confere-se a partir dos impactos que uma marca exerce em uma lógica de fluxo de capital, ou seja, é o entalhe simbólico na sociedade, o elemento que distingue uma marca de outra, que gera destaque e reconhecimento em determinado meio.

Não raro, empresas acabam por investir um grande montante de dinheiro na pesquisa, desenvolvimento e aplicação da marca. Porém, sem uma segurança jurídica, seria por certo muito dispendioso ter que sempre atualizar a marca para garantia do reconhecimento no mercado.

O registro da marca nada mais é do que uma concessão legal para garantir o uso exclusivo e proteção da marca em todo o território nacional, pelo período inicial de 10 anos, prorrogáveis por períodos iguais e sucessivos.

E é por isso que há uma proteção da marca por parte do Ordenamento Jurídico, para assegurar o gozo de sua especificidade e lucratividade decorrente do conhecimento coletivo. Atualmente regida pela Lei de Propriedade Industrial (LPI), sob a responsabilidade do Instituto de Propriedade Industrial do Brasil (INPI), que é o responsável por coordenar os processos de registro das marcas e por salvaguardar os direitos do detentor.

Todavia, existem algumas marcas que detém de um grande reconhecimento entre os consumidores, portanto, a estas é assegurada uma proteção especial, em todos os ramos e atividades, ultrapassando, assim, os limites do princípio da especificidade, são as conhecidas marcas de alto renome3.

Assim são definidas as marcas de alto renome:

“As marcas de alto renome são sinais que exercem magnetismo próprio, sobrevoando todas as categorias de produtos ou serviços e conservando o poder de distinção ainda que desvinculada de sua função originária”.4

Assim, tem-se que o alto renome de uma marca é situação de fato que decorre do amplo reconhecimento que o signo distintivo goza junto ao público consumidor.

Não obstante, não basta apenas a fácil identificação pelo público, sendo necessário também que a marca tenha prestígio e autoridade, requisitos e pressupostos essenciais para que uma marca goze desta proteção especial e seja elevada a uma classificação de alto renome.

Para que seja reconhecido o alto renome, o INPI, por meio de uma comissão especial, realiza um estudo técnico e detalhado para analisar se determinada marca atende às exigências para receber essa proteção especial, neste estudo serão consideradas algumas características: reputação, prestígio, grau de reconhecimento por ampla parcela do público residente no Brasil, além da exclusividade.

Alguns pré-requisitos atualizados pela resolução INPI/PR 172/16 são:

I. Reconhecimento da marca por ampla parcela do público brasileiro em geral;

II. Qualidade, reputação e prestígio que o público brasileiro em geral associa à marca e aos produtos ou serviços por ela assinalados; e

III. Grau de distintividade e exclusividade do sinal marcário em questão.

Cumpre ressaltar que para reconhecimento de alto renome, é necessário que a marca já esteja registrada no INPI com certificado de registro já expedido, formulando-se posteriormente, o pedido de reconhecimento como marca de alto renome, mediante peticionamento junto ao processo já existente no INPI da marca registrada, nos termos da resolução 107/13.5

Junto à petição de requerimento, deverão ser apresentadas as provas cabíveis à comprovação do alto renome da marca em âmbito Nacional, a resolução 107/13 recomenda que a comprovação se dê por meio de pesquisa de imagem de marca com abrangência nacional, sem prejuízo de outras provas, devendo conter as seguintes informações:

I. Extensão temporal da divulgação e uso efetivos da marca no mercado nacional e, eventualmente, no exterior;

II. Perfil e fração do público usuário ou potencial usuário dos produtos ou serviços a que a marca se aplica, e perfil e fração do público usuário de outros segmentos de mercado que, imediata e espontaneamente, identificam a marca com os produtos ou serviços a que ela se aplica;

III. Perfil e fração do público usuário ou potencial usuário dos produtos ou serviços a que a marca se aplica, e perfil e fração do público usuário de outros segmentos de mercado que, imediata e espontaneamente, identificam a marca

essencialmente pela sua tradição e qualificação no mercado;

IV. Meios de comercialização da marca no Brasil;

V. Amplitude geográfica da comercialização efetiva da marca no Brasil e,

eventualmente, no exterior;

VI. Meios de divulgação da marca no Brasil e, eventualmente, no exterior;

VII. Valor investido pelo titular em publicidade e propaganda da marca na mídia

brasileira nos últimos 5 (cinco) anos;

VIII. Volume de vendas do produto ou a receita do serviço nos últimos 5 (cinco)

anos;

IX. Valor econômico da marca no ativo patrimonial da empresa;

X. Perfil e número de pessoas no Brasil atingidas pelas mídias em que o titular

anuncia a sua marca;

XI. Informações que ofereçam indícios de que está havendo diluição da capacidade distintiva da marca alegada como de alto renome ou de que a mesma esteja sofrendo aproveitamento parasitário por terceiros;

XII. Informações que evidenciem a identificação do público com os valores da

marca;

XIII. Informações que demonstrem o grau de confiança do consumidor em relação à marca.

Caso seja deferida, o próprio INPI procederá com a anotação no registro da marca, indicando o seu reconhecimento como de alto renome, passando a marca a constar na lista de marcas de alto renome, junto às outras que já tiveram o reconhecimento deferido. Tal anotação perdurará por 10 (dez) anos.

2. Da marca de alto renome – Excepcionalidade

Em decorrência dos requisitos objetivos e, mormente, os subjetivos, percebe-se o fato de que o deferimento das marcas a nível de alto renome detém um caráter excepcional, sendo necessária a comprovação não só formal, mas também a constatação de que uma marca de fato é prestigiosa e conhecida e, por consequência, merecedora de macular o Princípio da Especialidade das Marcas.

Por sobre a excentricidade do deferimento de uma marca de alto renome, leciona Adonis Filho6:

Exceto pela imposição legislativa trazida pela Lei Geral da Copa, temos somente 18 marcas de alto renome reconhecidas pelas vias normais, ou seja, analisadas e anotadas pelo INPI em procedimento competente para tanto.

Não obstante, essa timidez é naturalmente explicada pelo grau de importância que essa condição especial, que é o alto renome, representa. Para ser considerado de alto renome, a marca precisa exercer força atrativa sobre o público em geral, atraindo clientela de diferentes mercados pela sua simples presença, o que não é tarefa simples e requer uma boa gestão da marca somada a altos investimentos.

Salienta-se que o excerto do artigo supracitado foi confeccionado em 2013. À época, havia-se 18 marcas de alto renome reconhecida pelas vias normais. O ano de 2020 só registrou uma marca a nível de alto renome, a marca YouTube (nominativa), em 18/2/20.

Ademais, Elizabeth Lima elucida que o pedido de elevação de uma marca a caráter de alto renome é um ato de proteção a alguma ameaça:7

Entretanto, para o INPI, o AR é uma proteção à marca e somente deve ser concedida se esta estiver correndo algum risco provocado por terceiros. Ela visa a proteger a marca do aproveitamento parasitário, da diluição. Não se faz necessário outorgar o AR somente como um título de status ou reconhecimento de fama, mas sim com o objetivo de estender a proteção legal de uma propriedade, neste caso a marca.

Infere-se que não só há dificuldades no que diz respeito à subsunção de requisitos formais e subjetivos, mas também é necessário demonstrar um possível ferimento ao direito à proteção da marca, ou seja, pela via incidental.

3. Conclusão

Conforme demonstrado, a marca de alto renome é uma exceção ao princípio da especialidade, entretanto, a sua concessão depende de diversos critérios, por vezes, subjetivos.

A marca de alto renome é assim considerada nos casos em que o sinal, devidamente registrado, goze de renome que transcenda o segmento de mercado para o qual foi originalmente destinado e, por isso, goza de proteção em todas as classes.

Uma vez sendo concedida, à marca de alto de renome será assegurada uma proteção especial dentro do Território Nacional, uma vez que será vetado o registro em qualquer outra classe de produto e/ou serviço.

_________

1 Art. 122. São suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais.

2 Revista CEPPG – CESUC – Centro de Ensino Superior de Catalão, Ano XIV, Nº 25 – 2º Semestre/2011. O Conceito de Marca e sua Proteção Jurídica. Guilherme Machado Aires.

3 Art. 125. À marca registrada no Brasil considerada de alto renome será assegurada proteção especial, em todos os ramos de atividade.

4 DANNEMAN, Siemensen Bigler & Ipanema Moreira. Comentários à lei de propriedade industrial e correlatos. Rio de Janeiro, São Paulo:Renovar, 2005, p 232.

5 Art. 2º A fim de poder gozar da proteção conferida pelo art. 125 da LPI, o titular de marca registrada no Brasil deverá requerer ao INPI o reconhecimento da alegada condição de alto renome de sua marca, por meio de petição específica, instruída com provas em idioma português.

6 MEDEIROS FILHO, Adonis Reis de. ANÁLISE DAS MARCAS DE ALTO RENOME EM VIGÊNCIA NO BRASIL. 2013. 10 f. Monografia (Especialização) – Curso de Direito, Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão/Se, 2013. Disponível clicando aqui . Acesso em: 08 abr. 2021.

7 LIMA, Elizabeth Andrade Pereira. Marcas de Alto Renome: uma Abordagem sobre Proteção Marcária e Aspectos Mercadológicos. 2010. 144 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Ciências Humanas, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica/Rj, 2010.

Amanda Resende Costa
Advogada graduada pela Universidade Católica de Brasília. Especialista em Direito do Trabalho. Pós-graduanda em Direito Corporativo e Governança pela Escola Paulista de Direito. Advogada do escritório Petrarca Advogados.

Thaís Gladys Burnett
Advogada graduada pelo UNICEUB. Especialista em Direito do Trabalho pelo Instituto de Direito Público. Pós-graduanda em Direito Corporativo e Governança pela Escola Paulista de Direito. Advogada do escritório Petrarca Advogados.

Luciano Lourenço Neto
Graduado em Jornalismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Graduando em Direito pela Universidade do Vale do Paraíba. Colaborador do escritório Petrarca Advogados.

Petrarca Advogados