Uma trabalhadora que descobriu a gravidez em novembro de 2020 teve a reversão da justa causa por abandono de emprego mantida pela 2ª Turma de Julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT). Ficou comprovado que o afastamento do emprego durante a pandemia foi necessário para preservar a vida da grávida e do bebê.
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A trabalhadora foi demitida em fevereiro de 2021 após comunicar aos empregadores que não iria mais comparecer ao trabalho por estar com medo de expor a si mesmo e ao bebê à doença que ainda não havia sido vacinada.
Após analisar as provas e o depoimento das testemunhas, o relator do processo, desembargador Aguimar Peixoto, confirmou a obrigação de a empresa pagar indenização correspondente aos salários que ela ganharia entre a data da dispensa e setembro de 2021, quando acabaria o período de estabilidade da gestante.
A representante da empresa, por exemplo, confirmou em seu depoimento que os empregadores tinham ciência da gestação, mas não ofereceram a opção de teletrabalho. “A autora não tinha opção, diante do cenário pandêmico, a não ser a recusa em retornar ao trabalho presencial, mormente porque poderia se expor sobremaneira ao contágio pela Covid-19 no percurso e no ambiente de trabalho”, destacou o relator.
Aguimar Peixoto destacou ainda que ficou demonstrado que a trabalhadora não tinha intenção de sair do emprego, “apenas ponderável preocupação em proteger sua saúde e a do nascituro, o que inibe a caracterização do abandono de emprego”.
A empresa apresentou um comunicado de abandono de emprego enviado para a trabalhadora em janeiro de 2021. Registro que, segundo o relator, apenas demonstra que a autora foi chamada a retornar às atividades presenciais, mas não modifica a conclusão de que não havia intenção de sair do trabalho. “O elemento intencional é imprescindível à caracterização do abandono de emprego, visto que a ausência ao trabalho deu-se diante de fundado temor de trabalhadora gestante de contágio em tal estado pela Covid-19”.
Embora inaplicável ao caso, já que entrou em vigor após o ocorrido, o relator destacou ainda a Lei 14.151, de maio de 2021, que determinou que durante a emergência de saúde pública trabalhadoras gestantes devem ficar afastadas do trabalho presencial sem prejuízo da remuneração. “Assim, mantenho a sentença que reconheceu que a rescisão operou-se sem justa causa, deferindo à reclamante as verbas rescisórias próprias da dispensa sem justa causa e respectiva estabilidade gestacional”, concluiu.
Perspectiva de Gênero
A decisão da 2ª Turma do TRT-23 confirma entendimento da 4ª Vara do Trabalho de Cuiabá na qual a juíza Deizimar Mendonça considerou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, instituído em fevereiro de 2021 pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Conforme apontou a magistrada, esse protocolo foi criado em harmonia com normas como a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW). O protocolo, explicou ela, reconhece as desigualdades históricas a que as mulheres estão submetidas e as consequências no reconhecimento de direitos nas decisões judiciais.
PJe: 0000348-10.2021.5.23.0004