Ações como a retenção de passaportes podem ser tomadas até que os devedores cumpram sua obrigação financeira
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por maioria, que medidas coercitivas “atípicas” para forçar o pagamento de dívidas, como a apreensão de passaporte de inadimplentes, podem ser impostas sem limitação temporal.
O entendimento é de que a ação pode servir para convencer o devedor de que é mais vantajoso cumprir a obrigação financeira do que, por exemplo, não pode viajar para o exterior.
No caso concreto, o colegiado negou habeas corpus a uma empresária do ramo de petróleo e combustíveis que pretendia receber de volta seu passaporte, apreendido há dois anos como medida para obrigá-la a pagar uma dívida de honorários advocatícios.
Ela deve, ao lado da filha e do genro, R$ 920 mil (em valores atualizados com juros e correção monetária) a uma advogada, por ter perdido uma ação judicial em abril de 2006 e ser condenada ao pagamento dos honorários advocatícios.
Como, 15 anos após o início do cumprimento da sentença, a dívida não foi paga e não houve oferecimento de bens à penhora pelos executados, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) manteve a retenção dos passaportes.
Na ação ao STJ, a empresária chegou a oferecer 30% dos seus rendimentos como aposentada e pensionista para quitar a dívida e liberar o documento, o que significaria R$ 1,5 mil por mês.
A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, rejeitou o pedido por considerar que, mesmo que o valor não fosse mais atualizado, ela demoraria 50 anos para quitar toda a dívida. A magistrada ressaltou que a devedora tem 71 anos e que, considerando que a média de vida dos brasileiros é de 76,8 anos, conforme o IBGE, “é bastante razoável inferir que nem mesmo metade da dívida será adimplida a partir do método sugerido pela paciente, de modo que está evidenciada a absoluta inocuidade da medida”.
De acordo com a relatora, a proposta “é até mesmo desrespeitosa e ofensiva ao credor e à dignidade do Poder Judiciário, na medida em que são oferecidas migalhas em troca de um passaporte para o mundo e, quiçá, para a inadimplência definitiva”.
A relatora salientou que as medidas executivas atípicas, sobretudo as coercitivas, não superam o princípio da patrimonialidade da execução e nem são penalidades judiciais impostas ao devedor.
De acordo com a ministra, as medidas atípicas “devem ser deferidas e mantidas enquanto conseguirem operar, sobre o devedor, restrições pessoais capazes de incomodar e suficientes para tirá-lo da zona de conforto, especialmente no que se refere aos seus deleites, aos seus banquetes, aos seus prazeres e aos seus luxos, todos bancados pelos credores”.
Para Andrighi, não deve haver um tempo fixo pré-estabelecido para a duração de uma medida coercitiva, que deve perdurar pelo tempo suficiente para dobrar a renitência do devedor. “Não há nenhuma circunstância fática justificadora do desbloqueio do passaporte da paciente e que autorize, antes da quitação da dívida, a retomada de suas viagens internacionais”, concluiu a relatora.
A decisão foi tomada no HC 711.194.