Omissão de informações da Administração sobre contratos com parte relacionada
Contexto fático
O processo foi instaurado para averiguar a responsabilidade de três administradores (diretor presidente – Acusado 1, membro do Conselho de Administração – Acusado 2 e Diretor de relações com investidores – Acusado 3) da empresa Springer S.A. por omissões de informações sobre contratos de consultoria com parte relacionada Afam Consultoria Empresarial Ltda.
À época dos fatos o Acusado 1 era diretor presidente das duas sociedades, sendo que os únicos cotistas da segunda Companhia (Afam), eram ele, sua esposa e suas filhas, fato que demonstra a inquestionável existência de partes relacionadas.
A acusação foi dividida em dois grupos. O primeiro grupo foi imputado apenas aos Acusados 1 e 3, para a averiguação da não divulgação das operações com a Afam nas demonstrações financeiras e no formulário de referência.
Já o segundo grupo foi atribuído aos três acusados, para investigar a atuação de desvio de finalidade (infração do art. 154, da Lei Societária[1]) na celebração, entre a Springer com a Afam, de contratos que não atendiam os fins sociais e não apresentavam benefícios à primeira.
Fundamentos da Decisão
O Relator apontou que é evidente que o contrato de consultoria e o contrato de prospecção de compradores celebrados entre a Springer e a Afam deveriam ter sido divulgados nas demonstrações contábeis referentes aos exercícios em que se sucederam, bem como nos formulários de referência. Portanto, para o Relator, a omissão de referida documentação, denota a intenção dos Acusados em omitir informações do mercado.
A não inclusão de aludidos instrumentos, mais do que um problema de ordem formal, contribuiu para que os investidores não tivessem conhecimento das operações entre as partes relacionadas.
Ademais, outro aspecto importante, é o fato de que, quando há a contratação de serviços prestados por administrador, a transparência é fundamental para que seja garantida a idoneidade da operação.
Com relação à infração do art. 154, da Lei Societária, ponderou que, apesar do dispositivo legal não vedar a contratação entre companhias de mesmos administradores, o contrato deve atingir os interesses da sociedade contratante e deve ser efetuado em condições equitativas. Nesse sentido, observou que no caso em apreço, os contratos firmados entre a Springer e a Arfam não eram úteis para a primeira, pois, a prestação de serviços contratada já era efetuada internamente.
Nesse contexto, os conselheiros deveriam ter fiscalizado a contratação entre as partes relacionadas, principalmente para garantir que não houvesse condutas desviantes, como a ocorrida no caso.
O Relator concluiu que, em análise dos autos, os contratos celebrados entre a Springer e Arfam foram meros mecanismos para a transferência de recursos da primeira para o Acusado 1. Assim, o grave desvio de recursos sociais demonstra a incapacidade dos acusados para administrar recursos de terceiros.
Decisão
Conforme apontado pelo Diretor, o episódio em questão pode minorar a confiabilidade de investidores nos mercados de capitais brasileiros, motivo pelo qual optou por penalidades mais severas.
À luz de todo o exposto, o Colegiado da CVM em consonância com o voto do Diretor Relator, decidiu por condenar os três acusados às seguintes penas:
- Acusado 1: (i) multa pecuniária no valor de R$ 660.000,00 (seiscentos e sessenta mil reais) devido a omissão de informações sobre o contrato de consultoria e de prospecção de compradores nas demonstrações financeiras; (ii) multa pecuniária no valor de R$ 220.000,00 (duzentos e vinte mil reais) devido a omissão de informações sobre o contrato de consultoria e prospecção de compradores nos formulários de referencia; e (iii) inabilitação temporária pelo prazo de 132 (cento e trinta e dois) meses para exercício de cargo de administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta por celebrar contrato de consultoria e de prospecção de compradores com a Arfam que não atingia os interesses sociais a Springer e representava benefícios para si próprio (infração do art. 154, da LSA);
- Acusado 2: (i) multa pecuniária no valor de R$ 540.000,00 (quinhentos e quarenta mil reais) devido a omissão de informações sobre o contrato de consultoria e de prospecção de compradores nas demonstrações financeiras; (ii) multa pecuniária no valor de R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais) devida a omissão de informações sobre o contrato de consultoria e de prospecção de compradores nos formulários de referencia; e (iii) inabilitação temporária pelo prazo de 108 (cento e oito) meses para exercício de cargo de administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta por celebrar contrato de consultoria e de prospecção de clientes com a Arfam que não atingia os interesses sociais a Springer e representava benefícios indevido ao diretor presidente da companhia (infração do art. 154, da LSA);
Acusado 3: inabilitação temporária pelo prazo de 120 (cento e vinte) meses para exercício de cargo de administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta por levar a Springer a celebrar contrato de consultoria e de prospecção de clientes com a Arfam, o qual não atendia os fins sociais a Springer e representava benefícios indevido ao diretor presidente da companhia (infração do art. 154, da LSA).
Confira a integra da decisão : http://www.cvm.gov.br/export/sites/cvm/noticias/anexos/2020/20200707_PAS_CVM_SEI_19957_010686_2017_22_voto_diretor_relator_gustavo_gonzalez.pdf
[1] Art. 154, Lei nº 6.404/1976: O administrador deve exercer as atribuições que a lei e o estatuto lhe conferem para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa.