A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou questão de ordem e reafirmou a tese fixada no Tema 692, com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação, adotando a seguinte redação: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
A questão de ordem foi proposta pelo ministro Og Fernandes, relator do tema, em razão da variedade de situações que ensejaram dúvidas quanto à persistência da orientação firmada pela tese repetitiva, bem como à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), que não apreciou o tema em repercussão geral ou controle concentrado de constitucionalidade.
Para o colegiado, as alterações legislativas trazidas pela Medida Provisória 871/2019 e, posteriormente, pela Lei 13.846/2019 no artigo 115, II, da Lei 8.213/1991 – que regulamenta a matéria no direito previdenciário – mantiveram a posição adotada pelo STJ, não havendo necessidade de alteração de entendimento.
Reversibilidade dos efeitos da decisão judicial é pressuposto da tutela de urgência
Segundo o ministro relator, sempre se considerou como pressuposto básico do instituto da tutela de urgência a reversibilidade dos efeitos da decisão judicial, consoante o artigo 273, parágrafo 2º, do CPC/1973 (correspondente ao artigo 300, parágrafo 3º, do CPC/2015).
No entanto, o magistrado lembrou que surgiram dúvidas no que tange à aplicação de tal regulamentação no âmbito previdenciário, especificamente em razão da redação original do artigo 130 da Lei 8.213/1991.
O ministro ressaltou que, com a alteração legislativa implementada pela Lei 9.528/1997 – por meio da qual passou a valer a regra geral do CPC, na ausência de norma especial em sentido contrário no âmbito previdenciário –, começou a amadurecer a posição no sentido da necessidade de devolução dos valores recebidos em caso de revogação da tutela antecipada, tendo o STJ, em 2014, firmado o entendimento repetitivo no Tema 692.
Entendimento mantido por alterações legislativas
Og Fernandes destacou que a partir da MP 871/2019 e, posteriormente, da Lei 13.846/2019, houve reformulação na legislação previdenciária. O artigo 115, II, da Lei 8.213/1991 passou a prever o desconto do benefício quando houver “pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% da sua importância”.
“Se o STJ – quando a legislação era pouco clara e deixava margem a dúvidas – já tinha firmado o entendimento vinculante no Tema Repetitivo 692, não é agora que deve alterar sua jurisprudência, justamente quando a posição da Corte foi sufragada expressamente pelo legislador reformador ao regulamentar a matéria”, opinou.
Revogação da tutela por mudança de jurisprudência deve ter efeitos modulados
No entanto, há situação diferente quando a tutela de urgência é revogada em razão de mudança superveniente da jurisprudência então dominante. “Nesses casos, a superação do precedente deverá ser acompanhada da indispensável modulação dos efeitos, a juízo do Tribunal que está promovendo a alteração jurisprudencial”, ressalvou o ministro em seu voto, destacando a necessidade, nestes casos, de modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.
“Dessa forma, uma eventual guinada jurisprudencial não resultará, em princípio, na devolução de valores recebidos por longo prazo devido à cassação de tutela de urgência concedida com base em jurisprudência dominante à época em que deferida, bastando que o tribunal, ao realizar a superação, determine a modulação dos efeitos”, afirmou.
Matéria infraconstitucional de competência do STJ
Ainda conforme o voto do relator, o fato de o STF ter alguns precedentes contrários ao entendimento do Tema 692 não invalida o repetitivo, uma vez que esse posicionamento da Suprema Corte foi adotado em algumas ações originárias (na maioria, mandados de segurança). “Porém, não o faz com caráter de guardião da Constituição Federal, mas sim na análise concreta das ações originárias. A maioria dos precedentes do STF não diz respeito a lides previdenciárias e, além disso, são todos anteriores às alterações inseridas no artigo 115, II, da Lei 8.213/1991”, esclareceu.