O Supremo Tribunal Federal julgou procedente ação direta de inconstitucionalidade (ADI) e reafirmou o entendimento de que constitui ofensa ao princípio federativo a requisição administrativa de bens ou serviços por uma unidade federativa a outra.
Por unanimidade, o tribunal excluiu do artigo 15, inciso XIII, da Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde (SUS) interpretação que possibilite a requisição administrativa de bens e serviços públicos de titularidade de outros entes federativos.
Na ação, o partido Democratas (DEM) argumentou que o dispositivo embasou a intervenção decretada pelo governo federal em hospitais do Rio de Janeiro em 2005. Segundo a legenda, a lei deixa em aberto a interpretação sobre quais pessoas jurídicas ficam sujeitas à requisição, em conflito com a Constituição, que só permite, em caso de perigo iminente, a requisição de bens de propriedade particular, e não públicos, como aconteceu no caso da intervenção no Rio de Janeiro.
Horizontalidade
No voto condutor do julgamento, o ministro Alexandre de Moraes explicou que o dispositivo impugnado trata da possibilidade de requisição no contexto das atribuições do SUS e, portanto, de competência comum entre os entes federativos.
A hipótese, segundo ele, pressupõe a existência de uma situação de necessidade coletiva, urgente e transitória, que afetará todos os níveis de entes federativos, exigindo coordenação horizontal entre eles.
Nesse sentido, para o ministro, não é possível estender a hipótese do artigo 5, inciso XXV, da Constituição da República, que prevê a requisição administrativa de bens particulares em caso de iminente perigo público, às relações entre entes federativos, que devem ser caracterizadas pela horizontalidade e cooperação.
A seu ver, a interferência da União sobre bens e serviços dos entes subnacionais foi admitida pelo constituinte apenas nas excepcionais hipóteses de intervenção federal e estado de sítio, sendo descabida a interpretação que a permita em cenário de normalidade institucional, mesmo no contexto extraordinário de pandemia de Covid-19.
Alexandre lembrou o recente julgamento da Ação Cível Originária (ACO) 3.463, em que o Plenário referendou medida cautelar para impedir que a União requisitasse insumos para a fabricação de vacina contra o coronavírus adquiridos pelo estado de São Paulo, sob pena de violação da autonomia estatal.
Para o ministro, a possibilidade de requisição pela União de bens públicos afetados ao desempenho de competências dos entes federativos diversos subverte a própria repartição constitucional de competências administrativas, em desfavor da autonomia e do equilíbrio do pacto federativo, sendo, portanto, flagrantemente inconstitucional.
Relator do processo, o ministro Dias Toffoli havia votado em sessão anterior pela improcedência do pedido, mas reajustou seu voto para acompanhar o entendimento de Alexandre de Moraes, na linha da mais recente jurisprudência da corte. Com informações da assessoria do STF.
ADI 3.454