A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que o ato judicial que decreta o fim do vínculo societário em relação a um sócio tem natureza de sentença, de modo que o recurso cabível é a apelação, conforme o artigo 1.009 do Código de Processo Civil.
O colegiado, por unanimidade, manteve acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina que não admitiu agravo de instrumento por meio do qual a ex-sócia de um escritório de advocacia recorreu da homologação do acordo celebrado entre ela e a firma para formalizar a sua retirada.
Relatora do recurso especial a ministra Nancy Andrighi apontou que “a interposição de agravo de instrumento contra sentença que homologa transação e extingue o processo com julgamento de mérito consiste em erro grosseiro, não admitindo a aplicação do princípio da fungibilidade”.
No acordo celebrado em primeira instância, as partes também concordaram com a apuração dos haveres da ex-sócia em liquidação de sentença, de acordo com o disposto no contrato social. A conciliação ocorreu em ação de exclusão de sócio, ajuizada pelo escritório.
Homologação de transação equivale a sentença
No STJ, a advogada sustentou que a homologação do acordo seria decisão parcial de mérito, porque, após a dissolução da sociedade, ainda restou a fase de liquidação. Segundo ela, a homologação seria uma decisão interlocutória e, como tal, poderia ser contestada por meio de agravo de instrumento (artigo 356, parágrafo 5º, do CPC).
A ministra Nancy Andrighi explicou que a ação de dissolução parcial de sociedade e de apuração de haveres engloba duas fases distintas: na primeira, avalia-se se é o caso ou não de decretar a dissolução; na segunda, são apurados os valores devidos ao sócio retirante ou excluído, como estabelecido nos artigos 604 a 609 do CPC.
De acordo com a relatora, a decisão de homologação registrou que o processo foi extinto com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso III, alínea b, do CPC, de modo que o pronunciamento judicial teve a natureza jurídica de sentença (artigo 203, parágrafo 1º, do CPC).
Erro grosseiro afasta princípio da fungibilidade recursal
Na visão da magistrada, ainda que não houvesse a sentença homologatória da transação no caso em julgamento, o pronunciamento judicial que decreta a dissolução parcial da sociedade em casos similares possui a natureza de sentença, “e não, como afirma a recorrente, de decisão parcial de mérito, de modo que o recurso contra ela cabível é a apelação”.
Sobre a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, requerida pela ex-sócia, Nancy Andrighi observou que, se não há dúvida razoável quanto ao recurso cabível, é inviável a aplicação desse princípio, cuja incidência não admite erro grosseiro no ato de recorrer.
Ademais – finalizou a ministra –, nem se poderia cogitar a ocorrência de julgamento parcial de mérito no caso específico, uma vez que a sentença “já definiu as premissas necessárias à apuração dos haveres, não havendo espaço para qualquer outra deliberação judicial nesta fase da ação”.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.954.643 – SC (2021/0140048-0)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : REJANE DA SILVA SANCHEZ
ADVOGADOS : FÁBIO LUIZ DA CUNHA – SC011735
REJANE DA SILVA SÁNCHEZ – SC015469
VINICIUS KÖERICH LOURENÇO – SC051598
RECORRIDO : CLAUDIA REGINA NICHNIG
RECORRIDO : NICHNIG E SANCHEZ ADVOCACIA E CONSULTORIA JURIDICA
ADVOGADO : SILVANA PASSOLD – SC014021
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL
DE SOCIEDADE. EXCLUSÃO DE SÓCIO. DECISÃO QUE HOMOLOGA
TRANSAÇÃO. NATUREZA JURÍDICA DE SENTENÇA. RECURSO CABÍVEL.
APELAÇÃO. ERRO GROSSEIRO. NÃO AUTORIZADA A APLICAÇÃO
DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE.
1. Ação ajuizada em 22/2/2012. Recurso especial interposto em 30/6/2020.
Autos conclusos ao gabinete da Relatora em 28/7/2021.
2. O propósito recursal consiste em definir o recurso cabível contra decisão que,
em ação de exclusão de sócio, homologa transação quanto à saída da sociedade e
fixa critérios para apuração dos haveres.
3. Estando cumulados pedidos de dissolução parcial de sociedade e de apuração
de haveres, a ação engloba duas fases distintas: na primeira, é apreciado
se é o caso ou não de se decretar a dissolução; na segunda, são apurados
os valores devidos ao sócio retirante ou excluído, de acordo com o procedimento
de liquidação específica previsto nos artigos 604 a 609 do CPC/15.
4. A decisão que decreta a resolução do vínculo societário em relação a um sócio,
como na espécie, encerrando a primeira fase da ação de dissolução parcial,
possui natureza de sentença. Doutrina.
5. Hipótese concreta em que o juízo de origem julgou extinto o processo
com resolução de mérito em virtude de as partes terem acordado acerca
da retirada da recorrente da sociedade e da recíproca prestação de contas.
6. O pronunciamento judicial que homologa transação (art. 487, III, “b” do CPC/15),
pondo fim à fase cognitiva do processo com resolução de mérito,
possui natureza jurídica de sentença, conforme disposto expressamente no art. 203, § 1º,
da lei adjetiva, desafiando, portanto, recurso de apelação.
7. A interposição de agravo de instrumento contra sentença que homologa transação
e extingue o processo com julgamento de mérito consiste em erro grosseiro,
não admitindo a aplicação do princípio da fungibilidade.
RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.
Fonte: STJ – Superior Tribunal de Justiça